Leonor Teles: a rainha que mereceu os sete anéis

Leonor Teles, de Isabel Stilwell, publicado pela Planeta Editora, é um romance que nos prende, fazendo jus ao estereótipo, da primeira à última página, numa narrativa que se constrói em seis partes.

Leonor menina, Leonor jovem, Leonor mulher: três facetas de um ser extraordinariamente inteligente e perspicaz que se fez a si próprio, por inconformismo, orgulho e voluntarismo para escapar de um casamento infeliz; casar-se com o homem amado, D. Fernando, tentar a todo o custo gerar um filho varão, e salvar um reino condenado a ser de Castela.

Quem foi então esta rainha, considerada bruxa, a «feiticeira dos cabelos ruivos», alcunhada de «aleivoja» pelo povo que lhe atribuía a culpa de todo o tipo de desgraças que assolavam Portugal, e que tinha roubado o coração do jovem rei? Quem era esta mulher diabolicamente sedutora a quem nenhum homem resistia, despertando a inveja de todas aquelas que com ela conviviam ou dela ouviam falar? Quem era a belíssima senhora do paço cuja literacia diplomática e estratégia política despertavam a admiração dos conselheiros mais próximos do rei e das cortes europeias?

Não me cabe aqui contar-vos tudo o que fiquei a saber sobre Leonor Teles, mas referir que uma grande parte da verdade, até pela investigação realizada pela autora, encontra-se nesta obra. A narração é feita de forma particularmente engenhosa, isto é, num discurso de terceira pessoa que nos guia ao longo desta história, de 1354 a 1385, e pela voz de uma narradora de primeira pessoa, a conceituada Condessa de Barcelos, tia de Leonor. E este é, a meu ver, no decorrer da diegese, um artifício narrativo usado para cunhar de uma ainda maior veracidade toda a intriga e, ao mesmo tempo, criar com o leitor uma reflexão conjunta, um quase diálogo, com esta personagem que tudo sabe sobre reis, famílias nobres, traições, fidelidade/ lealdade, não fosse ela meia-irmã do odioso Diogo Lopes Pacheco, um dos algozes de Inês de Castro.

Esta voz, aqui encaixada de forma muitíssimo bem pensada, é, em toda a narração, ágil no propósito que tem, pois faz-nos pensar em tudo o que acontece à volta da protagonista pelas reflexões que faz. Esposa e mãe dedicada, mulher cuidadora dos seus, que muito viu e muito ouviu; que sabe da miséria à qual o povo está sujeito, Guiomar é, como outras, uma das personagem fundamental do discurso.

Julgo poder afirmar que, mais do que qualquer outra, esta obra pretende contar-nos, como história que é, a vida de uma mulher que, tal como outras, se viu enredada nas teias do poder. A História confinou-a à maledicência que a descreveu como uma bruxa, uma mãe sem coração, uma rainha adúltera, imprópria de ostentar a coroa de um povo que se queria português.

Eu, que li Leonor Teles, cujo apontamento na capa «a rainha que desafiou um reino» (que vejo quase como um subtítulo), considero que ficamos a perceber que esta mulher fez tudo o que estava ao seu alcance para concretizar os seus sonhos, salvar o rei do envenenamento a que foi sujeito, resgatar a cada dia o reino do qual era rainha. Ser, afinal, a Leonor da História e a Leonor que a escritora construiu.

Desengane-se o leitor, se pensa que não me indignei com situações aqui descritas, claro que sim, mas, parece-me que, enquanto leitor convidado a «passear nos bosques da ficção», cabe-me vivenciar esta história de vida tão rica, e apenas recriminar Leonor por aquilo que a podemos julgar, fazendo, isso sim, a apologia merecida desta obra que nos apresenta uma mulher cujas características e personalidade a diferenciaram de outras.

A autora preocupou-se também em apresentar a genealogia da família de Leonor Teles, remontando ao reinado de D. Afonso IV, e, no final do livro, deixar-nos uma breve apresentação biográfica das personagens, umas fictícias e outras que integraram a nossa História, o que auxilia o leitor mais curioso ou que, como eu, também se esqueceu de sobrenomes de famílias relevantes ou pouco sabia dos parentescos entre elas.

Um livro que me merece *****

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